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RETOMADA PÓS-PANDEMIA REQUER PLANEJAMENTO
O Brasil só conseguirá sair da crise gerada pela pandemia de Coronavírus (Covid-19) com muito planejamento de longo prazo e ações coordenadas.
Nesse momento, em que todos nós esperamos ansiosamente a volta da “vida ao normal”, certamente vale resgatar um pensamento de Peter Drucker: “Long range planning does not deal with future decisions, but with the future of present decisions.” Em uma tradução livre, Drucker ensina que o planejamento de longo prazo não se trata de decisões tomadas no futuro, mas dos efeitos futuros de decisões tomadas agora, no presente.
É justamente essa reflexão do chamado Pai da Administração Moderna que deve nortear uma volta gradual de uma esperada retomada das atividades. Nesse sentido, o ministro da Saúde Nelson Teich foi assertivo ao dizer que o Ministério atuará em três frentes: entender melhor a doença e sua evolução; preparar a infraestrutura de atendimento hospitalar; e desenhar um programa de saída progressiva e estruturada do distanciamento social.
O primeiro passo, de fato, é conhecer bem os dados. Em qualquer gestão de crise a informação é essencial para um diagnóstico. O enfrentamento da epidemia depende de uma análise correta dos focos de transmissão, sabendo onde é necessário empreender mais esforços e, até mesmo, afrouxar o isolamento ou tomar medidas mais duras. Para isso o Brasil precisará ampliar sua capacidade de fazer testes em massa e, não menos importante, de analisá-los laboratorialmente com rapidez. A Coreia e a Alemanha são bons exemplos do acerto dessa estratégia. Com os resultados dos testes, conseguiram mapear os principais pontos de disseminação do Covid-19. E mais importante: informar as pessoas contaminadas, de modo que, com quarentena total, elas pudessem isolar-se em quarentena e as sintomáticas pudessem ser acompanhadas e terem o devido atendimento médico.
A segunda etapa, em paralelo, é equipar os sistemas de saúde. Não dá para se iludir. O uso de máscaras e os cuidados de higiene, bem como o afastamento de 2 metros entre as pessoas, de pouco valerão se não houver investimentos contínuos em treinamento e equipamentos de proteção médica para as equipes que trabalham nos hospitais; no incremento de unidades dedicadas ao atendimento de pacientes, em enfermaria e leitos e UTIs, além da aquisição e disponibilização de respiradores e outros dispositivos (para a diálise de quem tenha falência renal, por exemplo). Sem que o sistema de saúde respire e tenha plena segurança, tanto as unidades públicas como as privadas, qualquer pessoa estará em situação de extrema vulnerabilidade caso precise recorrer a um hospital. A construção de hospitais de campanha é uma boa saída — estamos em guerra. E os médicos, enfermeiros e auxiliares, assim como equipes de limpeza, precisam estar seguros para poder fazer seu trabalho. O País não pode poupar esforços para prover a esses profissionais todas as condições de trabalho e de conforto. Mais do que nunca, precisamos deles. É preciso preservá-los para que eles possam trabalhar seguros e salvar vidas.
A terceira etapa é a mais polêmica. E não deveria ser assim – visto que não deveria existir antagonismo entre Saúde e Economia. Elas são interdependentes. Por isso a informação é tão importante. Só com muita análise de dados será possível uma progressiva retomada. É fato que sem a economia girar, o País não terá caixa para suportar os investimentos em saúde e nos pacotes de socorro por um longo período. Assim como é fato que, sem que a população confie que não haverá uma segunda onda epidemiológica, as pessoas não se sentirão seguras para voltarem a produzir. Não queremos ver no Brasil as cenas lamentáveis que vimos em outros países – em alguns deles, com corpos abandonados nas ruas e falta de caixões para um sepultamento minimamente digno.
Como diz a canção de Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, nada será como antes. Quando acontecer, quando as duas premissas anteriores estiverem bem equacionadas, a retomada deve acontecer, mas de forma gradual, com base em dados, na ponta dos dedos, com todos os cuidados possíveis – especialmente com aqueles que pertencem ao chamado grupo de risco.
É difícil imaginar, a curto prazo, um mundo com grandes aglomerações em estádios de futebol, casas de shows, restaurantes. Um dos maiores desafios, sem dúvida, é o transporte público. Enquanto não houver vacina ou tratamento medicamentoso, as máscaras provavelmente deverão fazer parte da indumentária. Todas as empresas precisarão redobrar seus cuidados nos protocolos de Saúde, Meio Ambiente e Segurança.
Não há retomada possível sem plano e sem análise de cenário permanente. A hora é de empatia, integração de esforços e a noção de que somente sairemos dessa crise com decisões estruturadas, baseadas em fatos e dados.
Não há passe de mágica.
Rogério Nery de Siqueira Silva é CEO do Grupo Integração (afiliada da TV Globo no Triângulo Mineiro) e ex-secretário de Desenvolvimento Econômico do Estado de Minas Gerais
*Artigo originalmente publicado em 27.04.2020, no portal Poder360 (DF) – Poder360